Por que Doutorado em Políticas Públicas?
Na última terça-feira minha
orientadora me enviou (e aos seus demais orientandos) o link[i]
para assistirmos uma entrevista de uma importante cientista social gaúcha e
professora da USP, Marta Arretche. No dia, consegui assistir somente a metade. Ontem,
pós químio, tive a oportunidade de assistir o vídeo todo.
Gostei muito.
A gravação do vídeo, pelo que
entendi, foi iniciativa de seus próprios alunos e teve um tom bem acessível
para os parâmetros da academia. Além de ter sido apresentado suas motivações
pessoais para escolha da carreira ela falou abertamente da área que é a minha
de estudo e pesquisa também – Avaliação de Políticas Públicas -, de forma
bastante desnudada. Inclusive sobre a imagem memorizada que esta área tem dentro
da grande área das ciências sociais em geral e das Políticas Públicas em
específico.
Mas, de todo fato, o que me
chamou mais a atenção, foi a ideia do projeto de trazer ao conhecimento do
público em geral, não acadêmico, o que efetivamente se pesquisa e trabalha em
Políticas Públicas.
Trazer, de forma inteligível, ao
conhecimento do grande público o processo e os resultados do que, de fato,
fazemos lá na academia. (Em inovação, chamamos isto da fase de difusão do
conhecimento).
Vou dar um exemplo.
O título da minha tese de doutorado é, “A Política da Habitação de
Interesse Social em Porto Alegre: considerações acerca de sua efetividade no
período de 2009 a 2014”.
O título
é extenso, pomposo e, para muitos, pode significar, basicamente, coisa nenhuma.
Entretanto, todavia, contudo, porém, quando explico que o que pesquiso é se
as pessoas que receberam uma casa ou apartamento do DEMHAB entre 2009 e 2014,
em Porto alegre, estão melhores hoje, mais incluídas na sociedade e mais satisfeitas
do que antes, aí todo mundo entende, e tem várias considerações, percepções
e opiniões para compartilhar comigo sobre isto.
Então... esta é, efetivamente, uma escolha, de tantas outras,
que tenho feito ultimamente...
Quero ser uma cientista que poucos admiram e nem sabem o porquê?
Ou quero ser uma pessoa que pode contribuir para a sociedade em que atua com
seu trabalho?
Escolho a segunda opção. O que faz com que converse com moradores,
lideranças comunitárias, alunos e demais interessados na temática da Habitação
de Interesse Social, mesmo não sendo especialistas e estudiosos da área, pois
só assim, farei uma boa pesquisa que terá valor para outras pessoas e não será somente
a conquista de um título pessoal.
Mas de fato, por que resolvi fazer Políticas Públicas se
sou uma Administradora - que amo de paixão e sempre amarei -, estudei
Desenvolvimento no Mestrado e basicamente minha atuação profissional foi na
Gestão de instituições sem fins lucrativos (ONG’s) e governos? Ou seja, e quem
me conhece pessoalmente e profissionalmente sabe, meu viés sempre foi executivo
– fazer as coisas acontecerem.
Depois dos meus poucos anos de trabalho (ainda tenho muito
há trabalhar) percebi que uma das atuações mais estressantes e consumidoras de
energia e recursos nas organizações do Brasil é atuar na execução
(implementação) da forma que atuamos, toca-toca.
Isto quer dizer que atuamos, com paixão, criatividade,
garra e tudo mais que o brasileiro tem como ninguém, mas com pouco ou nenhuma
técnica de avaliação.
Isto significa dizer que a maioria das decisões tomadas
ainda são extremamente pessoalizadas e pouquissimamente fundamentadas pois, não
se valem, minimamente, de resultados quantificáveis do que já foi feito
anteriormente.
Trocando em miúdos, como o Estado pode saber se é melhor
construir casas para as pessoas que não tem renda ou investir em geração de
emprego e renda para que elas próprias, após determinado período, possam
adquirir suas próprias casas? Mas não só isto, como o Estado sabe, efetivamente,
que conceder uma moradia irá incluir esta pessoa na sociedade (ter acesso ao
transporte público, filhos poderem estar na escola, estar em segurança, participar
nas reuniões de condomínio, ter acesso ao posto de saúde, etc...) e se, em
específico, estas de Porto Alegre, incluíram?
Ainda não tenho todas estas respostas, mas estas são minha
busca na atividade de pesquisa do doutorado no momento. E no doutorado de
Políticas Públicas da UFRGS encontrei espaço e pessoas muito capacitadas para
me orientar nesta busca.
Em última instância, beneficiam-se muitos com este tipo de
pesquisa. A autarquia que implementa (DEMHAB) poderá fazer uso dos resultados
para melhorar sua implementação e ações futuras, o Estado como formulador da
política pode pensar sua revisão, o cidadão comum pode avaliar melhor as propostas
de candidatos a cargos públicos (Políticos ou não) e, em especial, os
beneficiários que podem atuar para melhorar e fazer pressão por melhores opções
de alocação de recursos dentro de uma política já existente.
O mais interessante é que Política Pública não é sinônimo
de Política Partidária como alguns confundem às vezes. O que significa dizer
que os diferentes partidos, com suas diferentes orientações políticas e
doutrinárias, todos, mas todos, mesmos fazem e influenciam as Políticas
Públicas sejam quando estão no poder (eleitos) seja quando estão na oposição
exercendo pressão (arena política), ou legislando (formulando), ou executando
em cargo de governo (implementando), isoladamente ou coligados.
Avaliar estes processos é uma atividade multidisciplinar e
de grande valia. Precisa, como a profa. Marta Arretch bem pontuou em sua
entrevista, de certa isenção e imparcialidade. Algo que felizmente encontrei no
curso da UFRGS.
Na disciplina de Políticas Comparadas que cursei em 2016
com a Profa. Soraya Côrtes fiquei encantada com a diversificação e qualidade
teórica dos textos do programa da disciplina. Estudamos e lemos sobre direita,
esquerda, redondo e quadrado para se colocar o mínimo. Aproveitei muitíssimo
mesmo esta disciplina, como todas as teóricas que me jogaram para dentro de um conteúdo
todo novo.
Mas, quem pensa que meu interesse em Políticas Públicas
está somente na área das Políticas Sociais, em especial da habitação de
interesse social, engana-se.
Entrei para pesquisar este tema, mas percebi, ao longo do
curso que o assunto me circunda todo dia.
Explico...
Quando estou doente de câncer, sou paciente, mas também
sou agente e parte de uma política pública na área da saúde de importância muito
maior do que meu caso isolado.
Descobri, ao fazer uso e parte da pesquisa clínica, que o
medicamento ou terapia que tenho ou não acesso faz parte deste ciclo e que, se
alguma etapa não estiver indo bem, custa a vida de milhões de pessoas.
Ou seja, com meu caso particular, também percebi que no
Brasil ainda há muito o que se avançar para que este ciclo fique claro para as
pessoas poderem se engajar e fazer parte dele.
As políticas da educação, também me impactam diretamente
uma vez que atuo profissionalmente nesta área. Em especial as da educação
superior.
Um exemplo de política pública para educação superior que
foi implementada pelo estado do RGS em 2001 foi a criação da UERGS –
Universidade do Estado do RGS – da qual tenho muito orgulho de ser parte como
docente.
A UERGS é resultado de uma política pública com um
objetivo muito maior do que somente a formação universitária. Ela foi criada através
de lei específica para fomentar o desenvolvimento do Estado através da formação
de recursos humanos altamente qualificados levando em consideração as
potencialidades regionais locais. Mas, o mais interessante é que é a única
universidade do nosso Estado (as federais também tem esta política) com
política de formação docente que permite, dadas condições legais, o afastamento
para capacitação docente nos níveis de pós-graduação, mestrado e doutorado.
Do pacote geral, este foi o que mais me atraiu quando decidi
prestar o concurso em 2014 e deixar a PUCRS e a ESPM-SUL onde lecionava. Entrei
sabendo que, concluindo meus requisitos, faria uso deste direito. Dito e feito,
o primeiro ano do doutorado foi lecionando, cumprindo todas as obrigatórias do
doutorado e, concomitantemente, me tratando.
Quando minha licença foi concedida, em maio de 2017, pude
me dedicar exclusivamente para o doutorado, o que tenho feito até agora
adiantado bastante meu curso.
Consegui aprovar e apresentar meu projeto de pesquisa em três
grandes congressos no ano passado, concluir meus créditos, obter as duas proficiências
em língua estrangeiras, ser aprovada no exame de qualificação e realizar a
coleta de 283 entrevistas representativas com moradores das residências foco da
minha pesquisa, criando assim, um banco de dados único sobre este tema na nossa
Porto Alegre.
Se, ainda estivesse lecionando, dificilmente conseguiria
os mesmos feitos.
Além do fato de que a oportunidade de estar “aluna” é um ganho
imensurável para minha própria atividade docente. Nada como inverter papéis
para se ter noção exata do que precisamos melhorar na nossa própria atuação.
A UERGS me oportuniza isto, esta política formulada lá
atrás me oportunizou isto, e sou imensamente grata pelo lugar fantástico onde
trabalho.
Voltarei logo, como digo, e com mais gás do que antes para
contribuir com esta Política Pública da Educação do Estado do RGS que faz todo
sentido, mas está precisando de carinho, atenção e apoio de toda nossa
sociedade. Apoio para seu fortalecimento e manutenção. Mas esta é outra história...
Enfim, estes são só alguns exemplos do porque o tema das políticas públicas está no meu encanto no momento, porque gosto tanto de falar
sobre o isto e porque penso que seu conhecimento deve ser mais difundido ao
público em geral. Espero ter contribuído um pouquinho para isto.
O teu texto de doutorado me encantou desde o inicio, como estou vibrando com as tuas conquistas e teu profissionalismo. Que continues com essa motivação e energia para apresentar esse belo e valioso trabalho.
ResponderExcluirObrigada Miriam por teu comentário!
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